segunda-feira, 21 de abril de 2008

A LUSA HARMONIA


(imagem obtida no urbanidades)

PUBLICADO NO DN - 22 DE ABRIL 2008

Vimos, ouvimos e lemos, não conseguimos ignorar e por isso redigimos esta carta, com harmonia, em resposta a quem assina E. F. (a propósito, quando é que vimos, ouvimos, lemos, e redigimos, no presente ou no passado?): com acordo ou sem acordo, as formas verbais na primeira pessoa do plural do presente e do pretérito perfeito simples do indicativo são formas homónimas, na esmagadora maioria dos verbos da segunda e terceira conjugações: comemos, lemos, sofremos, perdemos, rimos, progredimos, vivemos). E quanto aos verbos da primeira, os falantes nem sempre as distinguem foneticamente no ato de prolação: ama(á)mos ontem o que não amamos hoje. Conseguimos, no presente ou no passado, saber, como? Diga-no-lo o contexto do ato de fala. À letra, cada palavra deve ser entendida com o texto, que é isso que quer dizer "contexto". E com a vontade e a harmonia dos interlocutores e o desejo de entendimento sincero e não com os trocadilhos ouvidos do grande literato Vasco Graça Moura - senão teremos charadas e jogos florais, a que tanto se presta a nossa Língua (nossa, dos mais de duzentos milhões que a falam e não dos que, na faixa mais ocidental da Europa, da Galiza ao Algarve a criaram, desde o Galaico-Português – de quem é a herança materna: dos filhos que permaneceram na terra ou dos que emigraram e labutaram, ou das duas partes? A atitude dos lusos é a de que os seus antepassados que emigraram e fizeram Portugal eterno na sua Língua, tornando-a não local mas universal, nos Açores na Madeira, em Angola, no Brasil, em tantas outras partes da América, da Ásia ou da África, da Oceânia e da Europa não têm direito à herança da Língua comum, e têm de submeter-se aos ditames dos que nem ousaram partir. Que dirão a isto os Portugueses que, por esse mundo fora, falam a Língua que os liga à Pátria comum da Língua Portuguesa?) - acuso a recepção da carta e procurei ir, de facto, à génese da questão.

Costumo dizer que um sotaque é como um bom vinho, é uma marca de origem e é para manter. Há, porém, quem procure livrar-se dele… Mas há quem o exiba com orgulho justo e nobre. Veja-se Mota Amaral, e nós vemos logo a marca de origem, marca que, aliás, prezo, ou não tivesse eu também sangue açoriano a correr-me nas veias, com madeirense e beirão. Boa cepa, colheita de 1956.

Note-se que esta carta foi escrita com recurso à nova ortografia (ao longo da minha vida já aprendi várias), sendo que as palavras "facto", "recepção" e "génese" podiam ter sido escritas "fato", "receção" e "gênese", conforme a dupla ortografia que prevê o Acordo Ortográfico, justamente para respeitar a prolação e ortoépia dos falantes, que nada tem a ver com sotaque. (Já a harmonia - própria do homem moderno - não perde o "h", que é também de homem, que o não perde também, mesmo se for super-homem, a não ser que caia em desarmonia).

Três regras simples: o "h" inicial mantém-se sempre: homem, habitação, humanidade; (húmido/úmido admite duas grafias desde o Latim); as consoantes não articuladas nos vários países, caem todas: seleção, ação, redação, redator; as articuladas em algum país mas não noutro(s), admitem dupla grafia: recepção/receção; excepção/exceção, e ambas são corretas; o uso do hífen (-) continua complexo. E assim me despeço do autor que nós leitores conhecemos por E. F. (Conhecemos, no passado ou no presente?).

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