sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Salários dos gestores da CGD: a banca pública como centro de estágio e recrutamentopara a Banca Privada: é isso que a Esquerda quer? A Direita quer!

“De cada qual, segundo sua capacidade; a cada qual, segundo suas necessidades”. Variáveis: populismo, quem paga os salários, mercado, ideologia, banco público, sistema fiscal, relação de equilíbrio no interior da empresa, relação prémio resultados, soberania, serviço público. 1. 1.1 O que caracteriza o populismo é analisarmos uma questão sob o seu valor facial, sem estruturá-las segunda as diferentes variáveis. Exemplo: o salário dos novos gestores da CGD e o valor da pensão social. O resto das variáveis é ignorado. E quem é que se atreve a discordar, na fogueira inquisitorial das redes sociais, de que uma pensão mínima se torna mais imoral quando comparada com um salário de milhares de euros? 1.2 É imoral se for comparada com um gestor de um banco público, se for de um banco privado ninguém se indigna. Porquê? Por um equívoco, que uma frase atribuída a Margaret Thatcher ilustra. Dizia ela que os dinheiros públicos são das famílias. E eu pergunto: e os dinheiros dos lucros das empresas privadas, não são também das famílias? Na verdade, quem paga sempre é o cidadão, ou como contribuinte, quando a empresa é pública; ou como consumidor, quando a empresa é privada; 1.3 E se era assim antes da crise, ainda mais depois da crise: quem pagou o BANIF e o BPN? Quem financiou o BCP e o BPI, não foi a dívida pública via resgate? 1.4 Equívoco é também pensar que os salários dos gestores da CGD vêm diretamente do OE, quando não é assim. 1.5 Portanto, todo o sistema financeiro e empresarial em geral é financiado pelos cidadãos e pelas famílias. A diferença é que na banca privada, quando deu lucro, os dividendos foram distribuído pelos acionistas; quando deu prejuízo, foi dividido pelo cidadão contribuinte. Ao passo que a Banca Pública, a CGD, quando deu e quando voltar a dar lucro, esse lucro será entregue ao acionista Estado, isto é, aos cidadãos. Logo indignemo-nos e temos razão para isso pelos elevados salários dos gestores de todas as empresas em relação às pensões e não apenas pelo salários do público. E indignemo-nos também pelas discrepâncias salariais dentro das próprias empresas. E ainda pelas diferenças da distribuição de rendimentos na sociedade em geral entre o capital e o trabalho. Agora, indignar-se só quanto toca ao pública é tomar uma posição ideológica de Direita, mas sem ter a noção disso. 2. Coloquemos, então, como uma das variáveis dos gestores das empresas, sejam financeiras ou não, sejam públicas ou privados, a relação entre os salários de topo, a mediana salarial interna e o salário mais baixo da empresa, como se faz na Suiça, por exemplo, em que já se fez um referendo sobre essa questão e os suíços recusaram que a relação fosse alterada, aumentado o factor de multiplicação. E aí a regra seria a mesma para o pública e o privado. O que implica uma maior coesão social na comunidade nacional. O que torna completamente absurdo que cause indignação quando se compara uma salário de um gestor público com uma pensão baixa e não se sinta a mesma indignação quando comparada com o gestor privado. Claro, a ideia propalada pela direita de que o que é público é nosso e o que é privado é deles. 3. Outra variável é a dos resultados: manter um salário de base dos gestores e fazer depender a atribuição de um complemento de outra variável que seriam os resultados obtidos, em complementaridade com o que já se faz quanto à produtividade dos trabalhadores: a participação dos trabalhadores da banca nos resultado está dependente do fator produtividade. De futuro, isso devia ser alargado a todos os outros setores. 4. Outra variável é a questão ideológica e o mercado: como é que se pode defender a banca pública e não se quer os melhores para a gerir? Ora aí, é óbvio que entram as regras do mercado. 5. Ah, mas há o conceito do serviço público! O serviço público implicaria que um gestor, imbuído do espírito de serviço público e competente, seria imune às regras do mercado. Eu pergunto aos justiceiros morais das redes sociais se, em idêntica circunstância, abdicariam de um bom salário no privado por abnegação e serviço público. E aqui chegamos: compreendei o sentido da vossa posição: ao recusar os melhores gestores para a banca pública, tereis de ser responsáveis pelas consequências: ou não quereis os melhores para a banca pública e tê-la-eis gerida pelos piores; ou deveis assumir que sois contra a existência de uma Caixa Geral de Depósitos pública. E eis-nos desembarcados no cais onde nos espera a Direita, o PSD atual, neoliberal: a campanha do PSD, que contaminou as redes sociais, tem como base a posição do PSD e de Passos Coelho, que são contra uma CGD pública. Tendo perdido a guerra pela privatização e mudado de posição, por tática, o PSD não desiste da sua guerra contra o Banco Público. E procura ainda esconder a vitória clamorosa do atual governo em Bruxelas. 6. A última varável, mas não a menos importante é a questão de Soberania: a existência de um banco público é a derradeira hipótese de uma banca nacional, porque o País não tem músculo financeiro, pelo menos disponível, com as atuais regras europeias, para manter, maioritariamente, em mãos portuguesas, um banco privado de grandes dimensões. 7. Em conclusão: se a Esquerda, como a democracia-cristã, quer mesmo ter um banco público, não pode, demagógica e irresponsavelmente, tratar a questão dos salários dos gestores do banco público ignorando as diferentes variáveis em presença. E, sobretudo, não se deve deixar contaminar pela ideologia de Direita que está subjacente a certos pensamentos que hoje dominam o espaço público. Ou então teremos um banco público em que a única variável será a do serviço público, da dedicação à causa pública, e onde os melhores, como no futebol, serão contratados pelos grandes bancos do setor privado. Não me parece que a Esquerda possa aceitar que a CGD seja um centro de estágio e recrutamento dos melhores para a banca privada, com gestões instáveis e sempre provisórias, tratada como um banco de segunda divisão, sendo a banca privada a primeira divisão.

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

António Guterres Secretário-Geral da ONU, as razões de uma vitória



António Guterres é um homem de princípios, um grande humanista. Há dois aspetos importantes a salientar nesta eleição para SG da ONU. 
O papel de Ângela Merkel e o lugar de Portugal no mundo e o papel da diplomacia nessa questão. Merkel envolveu-se neste processo promovendo uma candidata com a cumplicidade da União Europeia e sofreu uma humilhante derrota. Isto é mais uma prova de que a chanceler não era a líder de que a Europa precisava que a Alemanha tivesse neste momento. 
A derrota da Alemanha e da comissão europeia correspondeu a uma vitória de Portugal. Causas dessa vitória: o candidato, a posição de Portugal no mundo e o papel da sua diplomacia. Por muito que custe à Alemanha, a geo-história e a geolinguística dão a Portugal um lugar privilegiado que a Alemanha não tem e duvido que alguma vez venha a atingir. Esta vitória de Portugal é também a vitória do espaço da lusofonia. 
A diplomacia portuguesa afirmou-se desde o princípio da nossa nacionalidade, desde o reconhecimento da Independência, no século XII (D. Afonso Henriques) e da Restauração (Pe. António Vieira), ao direito internacional sobre as terras descobertas (Infante D. Henrique) ao Tratado de Tordesilhas (D. João II), junto do papa, que tinha então um papel idêntico ao que tem hoje a ONU, do tratado de Madrid de 1750 (Gusmão), que torna o Brasil a grande potência que é hoje. Mas essa diplomacia só se exerce quando há fortes lideranças políticas, consenso nacional e grandes causas, uma coincidência que se verificou neste caso. O PR, o PM, o ministro dos negócios estrangeiros, o embaixador na ONU e as lideranças partidárias, todos tiveram um papel importante, nas respetivas funções e «fora».

terça-feira, 4 de outubro de 2016

Pensões mínimas, Pensão Social, a condição de recurso

1.     Eu concordo com a ideia essencial do  artigo de Ricardo Moreira, dirigente do Bloco: As pensões, num sistema de solidariedade bismarkiano como o que existe em Portugal, não pretendem responder à pobreza. A ideia das pensões é simples: substituir os rendimentos do trabalho.” Quanto a isto, é o Estado Social onde há direitos sociais e não favores assistenciais.
2.      Segundo ponto: “As chamadas pensões mínimas são atribuídas às pessoas que contribuíram menos do que o que lhes daria acesso a uma pensão completa (…)porque quando a Segurança Social portuguesa foi criada em 1976 se percebeu que muitas pessoas não tinham descontado para as caixas de previdência durante a ditadura, muitas vezes porque o sector não estava abrangido, o patrão não deixava ou simplesmente porque o patrão tinha desviado os fundos. Assim, criou-se um sistema de solidariedade redistributivo em que as pensões eram subidas administrativamente para tentar ir ao encontro do que as pessoas tinham trabalhado de facto, apesar de não feito as contribuições”.
Este ponto merece ser discutido justamente por causa do primeiro: se as pensões substituem os rendimentos do trabalho, isso significa que elas são o sucedâneo lógico de quem trabalhou e fez o descontos necessários ao seu salário. Os casos que o autor aponta são três: o setor não descontava, o patrão não queria ou o patrão desviava. Neste último caso, é um roubo e devem ser esclarecidos todas as situações. Mas há ainda os casos em que os próprios não o quiseram fazer.
3.     O autor fala ainda doutra situação em que quem não descontou nada recebe a pensão social. É aqui que o debate deve começar. Será justo atribuir uma pensão social a quem, nunca tendo descontado, tem recursos próprios suficientes e bastantes? A resposta é obviamente não!
4.     Desse ponto deve partir-se para o caso da atribuição de uma pensão mínima a quem teve um carreira contributiva mínima. Tirando o caso da gritante injustiça de penalizar quem foi esbulhado dos seus descontos, é evidente que atribuir uma pensão com base na presunção de carência sem a provar é em si mesmo uma injustiça ao sistema de Segurança Social que é baseado em direitos sociais adquiridos, primeiro ponto; e transformar-se-ia num caso assistencial desnecessário e contrário ao princípio invocado do sistema social que é o de a pensão substituir os rendimentos do trabalho sobre os quais incidiram os descontos, sem a ideia de qualquer concessão ou outorga, ideia em si mesma contrária ao Estado Social.  
5.     A sustentabilidade da Segurança Social é a base do Estado Social e é construída na ideia de que a sociedade se solidariza ativamente ou pelos descontos ou pelas transferências de quem precisa. Ou seja: as pensões substituem os salários sobre os quais foram feitos os descontos que garantem a sustentabilidade da Segurança Social; as outras pensões devem contemplar duas situações:
a)    Atribuir a pensão que resulta dos descontos efetivamente feitos; atribuir aos titulares destas no valor do que faltar para um valor socialmente justo a quem não tiver outros meios.
b)    Atribuir uma Pensão Social com a mesma base suficiente de uma vida com dignidade.
Em síntese, o que deve prevalecer é uma pensão social a atribuir a quem nunca descontou com um valor socialmente digno, tendo como referência o salário mínimo e a atribuição de um complemento às pensões do regime contributivo que fiquem abaixo da Pensão Social.
Para isso, deve haver abertura para um sistema de pensões socialmente justo e uma Segurança Social sustentável. E não pode haver uma Segurança Social sustentável se se atribuir pensões contra o princípio fundamental de que as pensões substituem o salário e foram obtidas a partir dos descontos efetuados sobre ele. Finalmente, uma sociedade não pode se sentir bem consigo mesma se houver a ideia e a situação que há pensões mínimas abaixo de uma linha mínima de vida digna.