sábado, 23 de maio de 2009

Depois do neo-liberalismo: dedicado aos economistas da área do PS, para que refli(c)tam

primeiro plano
Depois do neoliberalismo
por João Cardoso Rosas, Publicado em 21 de Maio de 2009

O neoliberalismo, surgido no final da década de 1970, acabou por sucumbir à crise que ele próprio criou. Que fazer com o seu legado?
Durante anos, um espectro pairou sobre a Europa e o mundo: foi o espectro do neoliberalismo. Alguns defenderam-no, outros combateram-no. Mas ele acabou por triunfar, no final dos anos setenta do século 20, para vir depois a soçobrar à crise que ele mesmo criou, durante o ano de 2008. Mas, afinal o que foi o neoliberalismo?


Esta doutrina defendia a privatização generalizada da actividade económica, incluindo sectores como os transportes, os correios, a água, os cuidados de saúde, a gestão das prisões, e por aí adiante. O neoliberalismo defendia também a desregulamentação, o que teve especial efeito nos mercados financeiros. Por fim, o neoliberalismo era a favor de cortes na despesa social do Estado e considerava que as desigualdades não constituíam em si mesmas um problema.

O neoliberalismo começou a ser aplicado durante a governação de Thatcher e Reagan. Apesar de ser uma ideologia de direita, o neoliberalismo não era a ideologia da direita tradicional, pelo menos na Europa. Aqui a direita sempre foi mais conservadora e, como tal, desconfiada em relação aos efeitos nocivos do mercado livre nas formas de vida tradicionais. Mas o neoliberalismo mudou a direita. Esta converteu-se ao mercado e passou a defender a ideia (muito duvidosa) segundo a qual tradição e forças de mercado são duas coisas naturalmente compatíveis.

O neoliberalismo acabou por afectar também a esquerda democrática. Em termos políticos, esta nunca conseguiu marcar a diferença de um modo claro, continuando o programa neoliberal de privatizações, desregulamentação e distanciamento face ao ideal redistributivo (neste caso, a esquerda deixou de falar de igualdade para passar a usar a linguagem mais suave da "inclusão"). Do ponto de vista ideológico, a esquerda democrática criou a "terceira via", o "novo centro", ou mesmo "a nossa via" do PS português. Mas tudo isso não passou de um expediente para fazer de conta que não tinha aderido, de facto, aos aspectos essenciais do neoliberalismo.

De repente surgiu a crise. O neoliberalismo mostrou a sua face mais negra: instabilidade dos mercados, aumento das desigualdades e da insegurança, crise da democracia, degradação ambiental. Esta é a factura negativa do neoliberalismo - e não é pequena. No entanto, devemos ser cautelosos. O neoliberalismo teve também uma face luminosa. Ele globalizou a economia e a tecnologia, trouxe riqueza a alguns e pelo menos alguma prosperidade a muitos outros, derrubou as ditaduras comunistas (como na União Soviética), ou obrigou- -as a adoptar a economia de mercado (como na China). Agora não é já possível nem desejável regressar às políticas neoliberais. Mas também não podemos esquecer o seu contributo positivo. Que fazer com o legado do neoliberalismo? Eis a questão.

Professor universitário de Teoria Política

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