quinta-feira, 25 de março de 2010

O crime compensa, Serge Halimi

Um artigo do Le monde diplomatique denuncia os abutres do sistema financeiro e explica o escandaloso conúbio e proveito das empresas de rating que nos fazem pagar a crise que eles próprios criaram, e como eles estão a lucrar com essa mesma crise, filha dos esquemas que o sistema financeiro pariu. Perceba o porquê de não ser mais possível salvar a economia no actual sistema capitalista, corrupto e decadente
Os Estados salvaram os bancos e não exigiram contrapartidas. Os bancos recuperam uma renovada força contra os Estados. Saqueiam-nos beneficiando da revelação das torpezas que lhes recomendaram. Porque, quando o crédito público diminui, as taxas de juro dos empréstimos aumentam…

Assim, a Goldman Sachs ajudou a Grécia, em segredo, a obter crédito no valor de milhares de milhões de euros. Depois, para contornar as regras europeias que limitavam o nível da dívida pública, a firma de Wall Street aconselhou Atenas a recorrer a engenhosos artifícios contabilísticos e financeiros. A factura destas inovações veio em seguida adensar a volumosa dívida grega [1]. Quem ganha, quem paga? Lloyd Craig Blankfein, presidente do conselho de administração da Goldman Sachs, acaba de receber um bónus de 9 milhões de dólares; os funcionários públicos helénicos vão perder o equivalente anual a um mês de salário.

Um pouco à semelhança da banca, um país é «demasiado grande para abrir falência» (ler o artigo de Laurent Cordonnier). Por isso também é salvo, mas ao país far-se-a pagar caro essa sobrevivência. O governador do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, mostra-se já tanto mais intratável em relação ao governo de Atenas quanto mais a sua instituição finge desvendar as patifarias de Wall Street. A Grécia, preveniu Trichet, vai ter que corrigir com o «maior vigor» a sua «trajectória aberrante». Sob «vigilância intensa e quase permanente» da União Europeia, isto é, renunciando à sua soberania económica, vai ter de diminuir o défice de 12,7 por cento do produto interno bruto (PIB) em 2009, para 3 por cento em 2012. Recuperar perto de dez pontos de PIB num saldo orçamental é um desafio, sobretudo numa zona de crescimento anémico. Não vai por isso tratar-se de «rigor», mas de cirurgia pesada. O paradoxo é que esta operação tem como objecto garantir a firmeza do euro num momento em que os Estados Unidos e a China estão empenhados em subavaliar as suas moedas, de modo a consolidarem as respectivas retomas [2]…

Angela Merkel considerou que seria «vergonhoso» que «os bancos, que já nos levaram à beira do precipício, tivessem igualmente participado na falsificação das estatísticas orçamentais da Grécia». Para a Goldman Sachs, estas pressões verbais não aquecem nem arrefecem. Aliás, o presidente Barack Obama, questionado sobre os bónus de Lloyd Craig Blankfein, não se deixou impressionar: «Como a maioria dos americanos, eu não censuro o êxito nem a fortuna. Fazem parte da economia de mercado». Esse «êxito», como se sabe, está ao serviço de toda a comunidade: não pagou há pouco a Goldman Sachs 0,6 por cento de impostos sobre os seus lucros [3]?

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