1. Toda
a vida fui socialista, ou, em termos europeus, social-democrata. E há muito
tempo estive à espera da derrota do partido do poder, dos partidos do poder, no
caso da Madeira o PSD.
2. E
toda a vida defendi a liberdade de expressão contra todas as formas de censura,
contra todas as formas de discriminação e humilhação do adversário, sobretudo
quando derrotado.
3. Passei
o período ingénuo o naïve da política, melhor, nunca partilhei a ideia
dicotómica que julgava que os bons
éramos nós e os maus os outros. E digo que nunca tive porque sempre tive o horror daquilo que Milan Kundera chama kitsch de política. Nós somos os melhores!,
cultura de autossatisfação de que padecem todas as forças políticas e todos os
poderes
4. Eis
a razão por que o sistema de partidos é o melhor para defesa da Democracia,
visto que, se todos eles têm essa cultura kitsch, qualquer deles, sem a fiscalização
dos outros e de uma liberdade de opinião garantida, cometeriam as maiores
atrocidades, fosse qual fosse a sua ideologia subjacente. Por isso, sempre preservei e defendi os
independentes genuínos, mas sempre tive horror aos movimentos populistas anti
partidos, mesmo reconhecendo que os partidos têm, como qualquer instituição, de
se renovar constantemente, com a certeza, porém, de que não há instituições perfeitas,
as tais que conduzem à ditadura.
5. A
minha consciência da realidade política madeirense teve um incremento decisivo
quando entrei para o Partido Socialista. Aí pude conhecer pessoas que, se
munidas de poder, fariam parecer meros episódios as atitudes autoritárias do
poder! Não hesito nem um instante em afirmar que algumas figuras da oposição
não dão garantias nenhumas – antes pelo contrário! – de exercício do poder: são
cínicas, perigosas, ditatoriais, persecutórias e sem qualquer pudor de afastar
do seu caminho quem se lhes opunha!
6. Esta
consciência da realidade não me impediu de continuar a ser oposição ao PSD,
porque era para mim o poder e todo o poder é, como já disse, kitsch, e muitos
anos de poder levam aos excessos e à sensação de impunidade.
7. Entretanto,
há duas derrotas que jogam a favor do PSD: a quase derrota do líder do PSD em eleições
internas, coisa que me deixou espantado – então um líder há tanto tempo no
poder não contra a máquina? - pensava eu,
militante do PSM, onde o poder do regime instalado internamente obtém sempre
vitórias estrondosas (e não só no PS-M,
por que razão Costa recuou e não se candidatou contra Seguro no Congresso?); a
outra derrota que joga a favor do PSD foi a grande derrota autárquica de 30 de
Setembro : afinal o controlo das mesas de voto, o processo eleitoral viciado
que a Oposição tanta alegava, de que eu era um dos paladinos, para justificar as
sucessivas derrotas eleitorais? A partir
de agora, e no futuro, alegar essa razão para derrotas eleitorais perde
qualquer sentido.
8. Dito
isto, e vamos à questão nuclear, porque é que não participo desta vitória e não
estou entre os vencedores. Julgo que as
razões democráticas ficaram já claras, mas falta a razão última e derradeira.
Uma coisa é ser contra o poder, cujo
kitsch eu abomino, em quaisquer circunstâncias, e o poder na Madeira é ou era o
PSD, e, com o PSD em 70, em 60, em 50%, pode-se, talvez, fechar os olhos à cultura
antidemocrático dos nossos correligionários – “não interessa a cor do gato,
interessa é que cace ratos” Deng-Ziao-Ping, - outra é sentir que o poder está
próximo e que os que o vão exercer estão muito longe de dar garantias de o
exercer democraticamente e em respeito pela diferença e pelos adversários.
9. Ora,
desde há algum tempo para cá, foi-se tornando percetível que o PSD iria ter resultados
historicamente baixos nestas eleições, mesmo que ninguém tivesse a noção da dimensão da derrota.
Contudo, devo dizer que, duas semanas antes das eleições de 29 de Setembro,
especulei sobre a “queda do regime” com alguns dirigentes da Oposição com a
queda de 7 concelhos, todos os que caíram, exceto Santana (em vez dela, Ponta
do Sol), e, no fim de semana eleitoral,
tive uma intuição, por alguns sinais que fui recebendo de vários quadrantes, incluindo
no sábado, um sensação de deslocação do eleitorado em direção à Mudança
idêntica àquele que se passou em Espanha, silenciosamente, depois do atentado
de Atocha, do PP em relação ao PSOE e a Zapatero. Disso dei conta também a
vários políticos, da Oposição e do
Poder.
10. Ora
acontece que, à medida que a derrota do poder começava a ser uma hipótese cada
vez mais provável, os meus conhecimentos da cultura antidemocrática e o
silêncio dos democratas – os democratas não se calam! - da Oposição – aumentava
a minha preocupação e distância de candidaturas que não se demarcavam de alguns,
não poucos, dos seus apoiantes e até candidatos, cuja arrogância e
agressividade aumentava à medida das hipóteses de vitória! Uma agressividade
traduzida em palavras e mesmo em atos nas ruas da cidade – aquele episódio da
caravana da Mudança junto à sede do PCP – Madeira, é, deveras, significativo e exemplar do que digo! (só
conheci coisa idêntica e de tal gravidade, logo na noite da vitória de Freitas do Amaral na
primeira volta das presidenciais em 1986, cercando a sede o PCP no Hotel
Vitória, o que, aliás, foi decisivo para o voto dos comunistas, na segunda
volta presidenciais contra Freitas do Amaral e, portanto, em Mário Soares).
11. Afinal,
qual era o erro do PCP: não ter aderido à coligação Mudança, ou seja, um
atentado à sua autonomia política. Imaginem esta gente no poder na Região: se
fazem isto a um Partido político, o que
não fariam a um simples cidadão que se lhes opusesse, nas redas sociais e nos
jornais?! Bem, nas redes sociais já vimos, durante esta campanha! Alguns
calaram-se em nome da derrota do poder, eu não me calei! Claro, tive a devida
recompensa, o insulto soez, prolífero e gratuito!
12. Não
generalizo, porque não gosto de generalizações, que são sempre injustas e
discriminatórias. Mas um ato individual de
prepotência e agravo em nome de um projeto generaliza-se quanto os defensores
desse projeto político não o condenam. Se alguém aqui contribuiu para a
generalização foi aqueles que viram e calaram, segundo o pensamento profundo de
Martin Luther King.
13. O
que vi foi o silêncio dos responsáveis políticos dessas candidaturas da
Oposição, enquanto os seus apoiantes agrediam verbalmente e insultavam os
críticos, mesmo apoiantes, e os adversários. O que vi foi os candidatos do PSD,
nomeadamente no Funchal e em Santa Cruz, e os seus apoiantes, terem mais
tolerância democrática com os seus adversários.
14. Em
conclusão: a prova de fogo da Democracia, a alternância, está feita. Falta
fazer a prova de fogo dos novos detentores do poder, neste caso, autárquico. A
legitimidade democrático ganha-se em eleições e consolida-se ou perde-se com o exercício
do poder. Não auguro nada de bom, quando parte dessa legitimidade já se perdeu
no próprio processo eleitoral que conduziu ao poder, e cujo silêncio compromete
os que o praticaram e os que se calaram.
15. Eis
as razões por que vos digo: não estou entre os vencedores – de 29 de Setembro.
Não me deem parabéns! Quanto aos que se multiplicam – agora! - alguns até se servindo de mim como escudo, em
intervenções nas redes sociais, se
colando à vitória, eu digo: podia até compreender o vosso silêncio antes, mas o
vosso alarde agora é obsceno e degradante! Calai-vos, em nome da decência e do
pudor, pelo menos por enquanto. Dai tempo ao tempo!