segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

O Novo Regime é indigno do gesto largo e magnânimo de Madiba




1.       O que faz a unanimidade à volta de Nelson Mandela não é, ou não é apenas, ter-se levantado em armas contra o apartheid: não – o que o torna unanimemente aceite é ter combatido o apartheid e ter sido magnânimo com os fautores desse sistema,  uma vez tendo o ANC conquistado o poder.
2.       O gesto de Nelson Mandela tem precedentes históricos. Os romanos tinham a divisa «Honra aos vencidos,  glória aos vencedores. Ora, aqueles acontecimentos na tomada de posse da «Mudança», aquelas vaias ao candidato vencido do poder municipal anterior simboliza que não se respeito a honra dos vencidos, tornando indignos da vitória os vencedores.
3.       Este gesto, nunca claramente condenado pelos novos titulares do poder municipal, contribuiu para o começo da perda da legitimidade conquistada nas urnas. A legitimidade, em democracia, conquista-se nas urnas, mas mantêm-se ou perde-se durante o exercício do poder.  Isso é completamente incompreensível para os próceres do Novo Regime.
4.       E aqui pergunta-se: o que fariam estes senhores se tivessem no lugar de Nelson Mandela? Obviamente prosseguiriam a luta armada contra os antigos detentores do poder. Na verdade, aqueles gritos ululantes são sinais de intolerância e de “guerra civil” que se estende nas redes sociais a quem os usa contrariar, quer o que defendem, quer o seu silêncio perante o que se vai passando…
5.       Aliás, e doutro ângulo, já só falta dizer a certos setores de esquerda que não nos devemos concentrar na fase «25 de Novembro» de Mandela, e que é preciso relembrar o período revolucionário, como se a síntese dos dois não fosse a grandeza de Madiba.
6.       E ainda de outro ângulo: a responsabilidade dos EUA, do Reino Unido e de Portugal – a superpotência, a potência administrante e a antiga potência com interesses geoestratégicos na zona, com guerras civis em Angola e Moçambique ao tempo da transição e com a hipótese -  perigosa – de a África do Sul vir a cair numa transição violenta, com um banho de sangue, dava-lhes especiais responsabilidades: se estas três potências incentivassem a luta armada já na etapa de transição, não estariam a inviabilizar a transição pacífica que veio a verificar-se? Não estariam a dar força ao setor do ANC que defendia a continuação da luta armada? E, assim, a complicar o percurso de Nelson Mandela na sua linha de pacificação e reconstrução da unidade da grande Nação sul-africana?
7.       Vem a propósito lembrar que o Presidente da República, na altura da votação na ONU, era Mário Soares, que, sobre o assunto, se mantém calado, o que pode significar que a posição de Portugal foi concertada entre Belém e São Bento.
8.       Finalmente, é certo que a realidade política da Madeira e da África do Sul são incomparáveis: na Madeira, não havia apartheid, trata-se apenas de umas eleições municipais e de  uma mudança de poder normal em democracia. Quer dizer, apartheid social havia, veja-se o caso da colonia, mas muitos defensores desse apartheid social estão… com o novo regime!