terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Produtividade, competitividade, rendibilidade, em vosso nome quantos crianças ficaram sem comer?

Faça-se justiça: a perda de direitos dos trabalhadores em nome da produção ou da produtividade não nasceu com os neo-liberais: leia-se o excerto seguinte de Das Kapital obtido aqui.


(...)

Com a mesma delicadeza de consciência observavam os fabricantes de vidro:

- Não é possível conceder aos meninos refeições regulares, porque se perderia, se desperdiçaria determinada quantidade de calor que os fornos irradiam.

Deu-lhes uma boa resposta o comissário de inquérito, White. Com modo de pensar diferente de Ure, Senior e seus pobres imitadores alemães como Roscher e quejanos, não se deixou levar pela abstinência, pela abnegação e parcimônia dos capitalistas, quando se trata de seu dinheiro, e pela sua prodigalidade em dilapidar vidas humanas, digna de um Tamerlão, dizendo: “É possível que se desperdice certa quantidade de calor acima da norma atual, assegurando-se tempo para refeições nesses casos, mas o valor em dinheiro é pequeno comparado com o desgaste de força vital que ocorre hoje no Reino Unido, em virtude de meninos, seres que estão em fase de crescimento, não disporem de tempo suficiente quando trabalham nas fábricas de vidros, para tomar comodamente seus alimentos e digeri-los” (L. c., p. XLV). E isto em 1865,o ano do progresso. Sem levar em conta o dispêndio de energia para levantar e carregar mercadorias, os meninos que trabalham nos fornos que fazem garrafas e flint glass andam durante a execução de seu trabalho ininterrupto 15 a 20 milhas inglesas em 6 horas. O trabalho dura freqüentemente 14 a 15 horas. Em muitos desses fornos de vidro vigora, como nas fiações de Moscovo, o sistema em que os mesmos operários se revezam de 6 em 6 horas. “Durante a semana o período mais longo de descanso é de 6 horas, e dele tem que ser deduzido o tempo para ir à fábrica, voltar dela, levantar-se, alimentar-se. O tempo que realmente sobra para repouso é extremamente curto. Não sobra tempo para diversão, para respirar ar puro, a não ser a custa de sono, tão indispensável para meninos que executam um trabalho tão fatigante numa atmosfera tão quente... Mas o breve sono é intranqüilo, pois o menino tem que contar consigo mesmo para despertar, se é noite, ou é perturbado por ruídos, se é dia.” O comissário White apresentou casos de meninos trabalhando 36 horas consecutivas; outros, de meninos de 12 anos que se esfalfam até 2 horas da madrugada dormindo na fábrica até às 5 horas da manhã (3 horas de sono), para começar de novo o trabalho. “A quantidade de trabalho”, dizem os redatores do relatório geral, Tremenheere e Tufnell, “que os meninos, meninas e mulheres realizam no curso de seu miraculoso esforço diurno ou noturno, é fabulosa” (L. c. , págs. XLIII e XLIV). Enquanto isso ocorre, talvez tarde da noite, o dono da fábrica de vidros, cheio de abstinência e de vinho do porto, sai do clube para casa, com passos incertos, cantarolando imbecilmente: Britons never, nevershall be slaves!

(Karl Marx, O Capital, Livro I, capítulo 8.4.)

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